A obra de Evandro Teixeira atua a contrapelo do “instante decisivo” da fotografia. Sua capacidade de estar diante não é pelo sentido da oportunidade de Cartier/Bresson de “estar no lugar certo, na hora certa”, mas de compreender como deve mover-se no interior da notícia para construir a imagem e a experiência dos fatos. Seu movimento é um embate físico, sensível e político com o que acontece. Com Teixeira, o aparato ótico – a câmera-olho – engendra um raciocínio plástico tão fluido quanto os acontecimentos, de forma que, ao fotógrafo, cabe constante engajamento e construção do lugar estratégico do olho-câmera.
Poeta do ângulo de visão e do ponto de vista, a força de suas fotografias transforma o habitual questionamento acerca de “como foi possível estar ali” em indagação sobre o lugar político do espectador. “Diante das fotos de Evandro Teixeira” – como já colocava Carlos Drummond de Andrade em poema (1986) homônimo sobre o artista – enxergamos a nós mesmos também em perspectiva e, especialmente, em nossa relação com o outro e com o todo. Diferentemente da geração de fotojornalistas anterior à sua, a qual buscou trazer à luz do Brasil “profundo” e “ancestral” (politicamente mantido á distância), Evandro Teixeira faz da fotografia um ato diário de resistência à opacidade do mundo, íntimo e imbuído de identificação. Assim é que, ao fotografar situações tão diversas quanto as manifestações estudantis de 1968, as histórias do abandono social de Canudos, o sertão de Vidas Secas, o golpe do Chile e o enterro de Neruda, o autor também se expõe e se dispõe ao gesto, à interpretação e ação dos sujeitos de sua imagem. Não à toa, Evandro se retrata como sertanejo quando fotografa desde o ponto de vista do chão rachado pela seca.
A “estética do chão” de Evandro Teixeira ombreia-se à presença significativa das perspectivas aéreas em sua obra, conhecido por circular com uma escadinha que era sacada a qualquer momento, erguendo o olhar acima do plano mais comum da cena. Movendo-se, portanto, dentro das imagens, Teixeira constrói enquadramentos pouco ordinários que indicam a capacidade de análise do momento fotografado, o olhar pensante que recria os acontecimentos ainda em seu decurso. Pois, como advertia Drummond, “dois olhos não são bastantes / para captar o que se oculta / no rápido florir de um gesto. / É preciso que a lente mágica / enriqueça a visão humana / e do real de cada coisa.
Paulo Herkenhoff
Curador
Diretor cultural do Museu de Arte do Rio – MAR